sábado, 24 de outubro de 2015

A VOZ DO AÇUDE

A VOZ DO AÇUDE DE LUCRECIA


Eu tive meu nascimento
Pelos outros planejado
Fui nascendo devagar
Pelas dôres ajudado
Quando cheguei foi sucesso
Parecia que o progresso
Vinha também do meu lado

Fui crescendo devagar
A natureza ajudando
Até que fiquei formado
Toda hora trabalhando
Em muitas atividades
Mil e umas atividades
Iam de mim explorando

Ao romper da alvorada
A brisa soprava fria 
Passava a noite aquecido
Quando a brisa me envolvia 
Soltava um som tão bonito
Sumia no infinito
Com a chegada do dia

Água tinha em abundância
Pra tudo que precisava
Um recipiente cheio
No ano que não sangrava
Nada ia enterroper
Não dava nem pra saber 
Se o meu nível baixava

Forneci muito alimentos
Para o povo do sertão
Matei a fome do povo
Salvei vidas fiz questão
De abastecer as mesas
Diminuindo as depesas
Com arroz milho e feijão

Batata doce e tomate 
Eram muito procuradas
Para outras regiões
Elas eram exportadas
Geraram empregos rendas
Eram muitas encomendas
Pelo povo encomendadas

O lazer era infalivel
Todo final de semana
Recebi muitos turistas
Da terra paraibana
Pulavam do meu chapéu
Só não era como o céu
Porque consumiam cana

Navegavam de canoa
Pescavam peixe e comiam
O que sobrava da farra
Para o comercio vendiam
Era grande a abundância
Ninguém media a distância
Pra ter o que pretendiam

Quando a chuva caia
Iniciando o inverno
Peixes formavam cardumes
Subia e ficava externo
Até criança pegava
Como era liso soltava
Lama e terra era seu terno

Pobre que não tinha nada
Se tornou um fazendeiro
Platava capim que dava
Pra ganhar muito dinheiro
Criava gado e vendia
E o leite garantia
Todo dia o seu têmpero 

Me tornei ponto turistico
Oferecendo lazer
Somente durante o dia
A noite poucos iam ver
Quando a água se bulia
Um  bicho aparecia
E aja gente correr

A lenda diz o formato 
Parecia um animal
Dois metros de comprimento
A largura era normal
Piabas festa fazia
Uma voz no ar dizia
Se afugentem do mal

Uns viam e outros não
Aquele bicho falado
Era o assunto do povo
Isso é um pagão jogado
A mãe pra não ser falada
É assassina malvada
Ele quer ser batizado

Depois as águas baixaram
Tudo desapareceu
O bicho lá do açude
Com a quintura morreu
Ta enterrado na lama
Quam deu tanto ibop e fama
Ninguém nunca conheceu

Era muito visitado
Por gente e animais
Se refrescavam nas águas
Me exploravam demais
Destruindo minha vida
Abriam tantas feridas
Que não saram nunca mais

Fui agregado do povo
Pra todas as necessidades
Disposto para servir
A muitos localidades
Do trabalho ao lazer
Água para abastecer
Fazendas sítios e cidades

Os anos foram passando 
E eu fui adoecendo 
Gemia ninguém ouvia 
Dia e noite padecendo
Sem perceber o motivo
Me tornava num cativo
Do que estava sofrendo

Senti uma força forte
Mandando eu observar
Vi esgoto imundo entrando
Onde não podia entrar
Os animais que morriam
Depois que apodreciam
Vinham em mim despejar

A imundice trazida
Pelas mãos que ajudei
Jogados dentro de mim 
Confesso que fracassei 
Mais de setenta por cento 
Foi o maior sofrimento
Que muitos anos enfrentei

Ainda pude observar 
Uma grande podridão
Penetrando em minhas veias
Descendo até o porão
Onde a água limpa e pura 
Com sujeira se mistura
Formando a poluição

Ainda fui mais além
De susto fiquei parado
Virei uma grande fossa
Que povo mal educado
Vão matar de sofrimento
O pivor do alimento 
Que nos lares tem chegado

Chorei muito de tristeza 
Sentindo muita agonia
As vertentes soterrados
Escavação na sangria
Tanta água destruida
Aos poucos tirando a vida
De quem com gosto servia

E assim foi muitos anos
Sofrendo para sustentar
Familias de longe e perto
Que quisesse trabalhar
De mim tirava o sustento
Mas se moresse um jumento
Trazia pra me ofertar

Assim ia acomulando
Toda imundice que havia
A CAERN ia tratando
Mas muito pouco servia
A chuva foi se afastando
O poço grande secando 
Seu volume todo dia

A mãe natureza disse
Meu filho a dor te sufoca
A ingratidão do povo
Todo o mal te provoca
Mas continue na missão
Mesmo com perseguição
Ofereça o bem em troca

Olhando ao meu redor
Vejo tudo se acabando
Capim tostado fedendo
A lama toda rachando
Os peixes todos morrendo
Dentro da lama batendo
E outros se sufocando

A minha água fedida
Todo mundo aproveitava
Seu volume foi baixando
Ao povo preocupava
Até que chegou o dia
Na torneira não saia
Nenhuma gota pingava

Estou com mais de oitenta
Prestando serviço ao povo
Ninguém me reconheceu
Morro pra nascer um novo
Que possa exigir respeito
Pra não sofrer do meu jeito
Igual um pinto no ovo

Adeus dias de alegria 
Quando as chuvas me enchia
As águas das cachoeiras
Em busca de mim descia
Adeus vazantes adeus campos
Adeus luz dos pirilampos 
Quando terminava o dia

A todos meus usuários
Minha recomendção
Que nunca falte dinheiro
Coragem e disposição
Aprendam economizar
Pra nunca água faltar
Em cada habitação

Esta é minha despedida 
É longa minha história
Os meus primeiros contatos
Ficou gravado em memória
Meu lema foi ajudar
Sofri muito pra chegar
Ao final da trajetória

Termino clamando aos céus
Não deixe o sol me queimar
Leve um pouquinho de mim 
E se puder transformar
Faça ao menos chuva fina
Cair como uma neblina
Na hora deu expirar.

 HELENA BEZERRA.


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